PROJETO JAUAPERÍ 

Cooperativa di Rio Jauaperí


PESQUISA DE CAMPO - MARÇO 1999

CONSIDERAÇÕES BÁSICAS

As comunidades e moradores isolados visitados, são cidadãos dos municípios de Rorainópolis (RR) e de Novo Airão (AM).

Em geral nota-se um tratamento algo melhor nas comunidades que pertencem ao Estado de Roraima, fundamentalmente no que se refere à educação, pois as comunidades de Sumaúma e Itaquera tem escola com professor e recebem merenda para os alunos, e também pela distribuição de motores geradores de energia elétrica e o óleo Diesel mensal utilizado (Sumaúma e Itaquera).

Em geral as deficiências na produção e no seu escoamento são praticamente as mesmas em todas as comunidades do rio Jauaperí. Comentasse que numerosos moradores procuram nas comunidades do Paraná da floresta e do rio Branco compradores para a farinha, e em Novo Airão para o Açaí e a banana, encontrando interesse mais não recursos, o que muitas vezes se reflecte no retorno a casa com toda a mercadoria, e na diminuição do interesse em produzir numa próxima oportunidade.

As razães da nossa pesquisa

Explicamos aos comunitários e isolados com os que mantemos contato, que existe a possibilidade de por em pratica um projecto junto a uma grande instituição internacional, para assim preservar a floresta, melhorar a qualidade de vida, aumentar a produção e evitar o êxodo rural, e que a nossa visita era para colher as informaçães básicas sobre produção nativa e cultivada e saber o teor de aceitação da idéia entre os comunitários, dados que serão examinados para assim definir se o projecto pode ser levado adiante de forma real e bem justificada.

LOGISTICA

A pesquisa iniciou-se no local Carabinani, 30 minutos rio acima do Xiparinã, seguindo até a comunidade de Tanauaú, última antes de chegar no rio Negro, passando pelas comunidades de Samauma, São Pedro, Itaquera e Palestina.

PESQUISA DIRETA

CARABINANI -

Falamos como o único proprietário, Sr. Cláudio Amazonas ( o mudo) , que vive no local à quase 40 anos, fuimos acompanhados pelo Seu Paulo para entender melhor a linguagem do mudo. O mudo é uma das figuras mais trabalhadoras do rio, é também um ermitão perfeito. A sua produção principal é a castanha do Pará, embora na sua área existem também numerosas palmeiras de açaí, que neste ano prometem uma boa produção. O mudo planta também mandioca, com a que se auto abastece de farinha e as vezes a troca com o regatão, faz assim também com a banana e o milho. A sua produção pode aumentar na medida em que possa incorporar um motor de cevar mandioca. Ele está de acordo em fazer parte de uma cooperativa, se esta vier a nascer, e colocar nela a sua produção. O regatão passa na sua propriedade as vezes, deixando-o muitas outras sem aquilo que está necessitando ou sem condiçães de tempo de vender o seu excedente. Nada falamos de comprar a sua terra, embora ele seja um homem sozinho e sem família, é a única coisa que tem ( é o maior dos sítios pessoais no Jauaperi) e é fortemente unido a ela.

MARRAU

O Sr. Barroso, atual morador da comunidade de São Pedro, foi o primeiro morador fixo do local, ao abandona-lo, à 12 anos, ficou sem morador aproximadamente 2 anos, até a chegada do Sr. Bené, que no dia da nossa visita não se encontrava no local. O Bené planta mandioca, banana e milho, que consume e em parte troca com o regatão pelos gêneros que necessita. A sua profissão mais conhecida é a de construtor de canoas e barcos regionais, que faz principalmente por encomenda. O Marrau é o local vizinho imediato da linha Xiparinã.

LINHA XIPARINÃ

No extremo interior da nossa reserva mora o Edmilson Ferreira da Cruz, juntado à aproximadamente 10 anos com Misti, filha do Seu Carlos e de Dona Odete, com a qual tem 4 filhos, uma delas falecida à dois anos. O Edmilson mora na reserva mais nunca temos realmente considerado eles na grande família, principalmente no que tange à ajuda com rancho, etc. Ele está disposto positivamente a vender a sua produção, que no caso da farinha não é maior por causa de não ter um motor para cevar a mandioca.

SAMAUMA

Foi feita uma reunião com a maioria dos moradores, liderados pelo Oseias, marido da Regina, operadora da radio. Todos foram bem positivos e estão disposto a vender a sua produção para a cooperativa, se esta vier a existir. A produção local mensal é fundamentalmente a mandioca, a cana de açúcar e a banana. Como na maioria dos locais no Jauaperí, as pessoas, quando à incentivo, quer disser ajuda anterior (rancho, sacos, etc.) e a certeza da compra, vinculam-se ao extrativismo de cipó titica, do açaí, castanha, caçari e madeira. Foi falado claramente que a cooperativa, no caso de vir a existir, terá uma função social , ligada basicamente à preservação e à qualidade da vida na região.

SÃO PEDRO

Fumos recebidos pelo Almir, que tem a maior roça da comunidade e pelo Sr. Barroso, morador antigo do Marrau e actualmente uma das lideranças locais (excelente tecedor de cipó titica) , foram também chamadas algumas outras pessoas jovens e mulheres para participar do encontro.
A comunidade está positivamente de acordo em vender a produção para a cooperativa. Explicaram que a produção atual. é bastante pequena, quase que só para uso familiar, fundamentalmente pela falta de incentivo no inicio da plantação, que deve ficar alguns meses esperando atingir a hora dos frutos, e porque plantar na região requer um grande esforço físico (atender as necessidades de 10 has, no inicio, não deixa tempo para a pessoa procurar o seu sustento) e de tempo.

ITAQUERA

Falamos bastante com o Sr. João Bastos, uma das lideranças e com o Sr. Ribamar, outra liderança e um dos mais antigos moradores do Rio Jauaperi. Houve reunião no centro comunitário, com participação de numerosas pessoas e da professora Paula, irmã da esposa do João Bastos.
A reunião foi boa, se bem que a professora Paula troce a sua opinião no sentido de que eles tem que esperar acontecer para realmente ter uma posição ( este comportamento, em parte, tem base nas permanentes promessas do setor político, que rara vez são cumpridas) A comunidade de Itaquera, como as outras, produz farinha, milho, cana, banana e cupuaçu, em quantidades relativamente pequenas, vinculadas fundamentalmente à falta de comprador regular , o Sr. João Bastos é fabricante de canoas.

PALESTINA

Esta comunidade tem como a principal ocupação a pesca, possuindo também motor de pesca próprio, não da comunidade, mais da família Nascimento, que é a mais numerosa e antiga da comunidade.
A plantação é feita apenas para subsistência. As pessoas com as que conversamos acham que havendo possibilidades de venda regular de produção, haverá maior numero de roças.

TANAUAÚ

Falamos com os Sres. Lidio, Samuel e Renato, comunitários responsáveis , e ficou claro que a falta de apoio e de compra regular é o que produz a baixa produção local.
No caso que a cooperativa venha existir, estão de acordo em participar. A comunidade não tem escola, mesmo tendo 9 crianças, porque as autoridades de Novo Airão exigem um mínimo de 12 alunos para ter escola.
As plantaçães são de subsistência.

NOVO AIRÃO

Fuimos visitar o Sr. Eli, que foi presidente da comunidade de São Pedro e bastante nos ajudou na época.
O Sr. Eli está atualmente desempregado e o seu barco está parado porque não tem o dinheiro para terminar os trabalhos. Ficou feliz com as possibilidades e se colocou a disposição para o que possa ser útil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

  • - Todas as comunidades reconhecem a falta de apoio público e a falta de futuro nessas condiçães.
  • - Nenhuma tem jamais recebido formação técnica em relação ao uso da terra, de melhores sementes, de tratamentos de compost ou de defesas orgânicas que podem ser feitas no local .
  • - Não existe uma produção media, que hoje seria bastante pobre, mais se for feito um trabalho no que se refere às possibilidades de incorporar novos sistemas de agricultura orgânica, num verdadeiro processo de ensino, existiriam em 1 ano quantidades importantes e comunidades mais modernas e claramente mais auto-suficientes.
  • - A alimentação é fraca e pouco variada, sendo assim, temos comunidades com deficiências vitaminicas, e em consequência, mais fáceis de serem atingidas por doenças tropicais, verminoses, malarias, etc.
  • - Aqueles que tiram madeira não tem jamais feito o trabalho de reflorestar. Poderia ser simples que o serrador, com ajuda de um ou dois filhos, produza algumas mudas cada mês e as plante para evitar o que já está acontecendo na maior parte do rio.
  • - Não existe nenhuma consciência em relação à fragilidade e importância dos ecossistemas locais.
  • - A capacidade da mão de obra local está concentrada em aproximadamente 300 pessoas ativas.
  • PRODUÇÃO CULTIVADA

    Hoje em dia a produção é praticamente de subsistência em todas as comunidades, pudendo ter alguns excedentes mensais na farinha e na banana (principalmente pacovão e maça).
    Um homem produzindo farinha de forma mecanizada, pode obter até 1 tonelada de farinha ao mês.
    O plantio da banana necessita alguns ensinos técnicos, pois está sofrendo com pragas e com redução de tamanho e quantidade a partir da Segunda safra. A falta de qualidade do solo e o seu pouco tratamento não deixam chances de fazer um bom trabalho.
    A mandioca associada à uma planta de feijão dá excelentes frutos, são plantas de apoio mutuo, também pode se trabalhar com plantas que ajudam a combater as formigas, etc., essa técnica, chamada Permacultura (Cultura permanente) pode ser simplesmente uma das maiores luzes do próximo milênio.

    O Jauaperí pode produzir algumas toneladas de farinha mensal (até 70 ton. aprox.)
    A banana também é um importante produto da região. Milho, Cana, cupuaçú e outras plantas, podem constitui-se numa fonte mensal importante.
    O controle do rio no que se refere à entrada de barcos peixeiros está sendo fiscalizado pela patrulha dos índios Waimiri-Atroari, com todas as credenciais do Ibama. Este fato está sendo de extrema utilidade para que cessem as açães predatórias de pesca e caça ilegal.

    PRODUÇÃO NATIVA

    CASTANHA

    A região do baixo Jauaperí produz essencialmente castanha, nos meses de abril a agosto, um ano sim, um ano não, e este ano de 1999, não terá produção.
    A produção media colhida neste período, no baixo Jauaperí, em anos bons, chega aproximadamente às 50/60 toneladas de castanha lavada com casca. Existindo um sistema de escoamento da produção bem organizado, a produção pode dobrar.
    Normalmente os regatães (barqueiros compradores) fornecem o rancho que a equipe de trabalho vai necessitar, ficando assim comprometidas ambas as partes. O regatão descontará o valor do rancho na conta final. No ano de 1998, uma barrica (aprox. 120 quilos) era comprada pelos regatães a R$ 25 ( na época o dólar estava 1=1).

    AÇAÍ

    A palmeira de açaí está bem distribuída em toda a região do baixo Jauaperí. Com seus frutos realiza-se um vinho sem álcool que é bastante apreciado pela população urbana e rural.
    Os meses de colheita são principalmente maio e junho. Um homem pode colher até 3 sacos ao dia (3 sacos podem produzir até 120 litros de açaí de boa qualidade).
    Os frutos do açaí só podem ser guardado até 3 dias depois de retirados da palmeira. No gelo estes podem durar bem mais.
    Um litro de açaí de boa qualidade, em Manaus ,está sendo vendido, ao publico, a R$ 1,50 o litro, e no atacado a R$ 1..

    BACAVA, BURITI

    Estas palmeiras são nativas e anualmente produzem importantes quantidades. Não tenho dados técnicos suficientes, mais podemos considera-las como uma outra fonte de recursos naturais renováveis de importância.

    CAÇARI

    Também é conhecido pelo nome de Camu-Camu . O caçari frutifica nas beiradas do Jauaperí , especialmente no mês de fevereiro, e produz uma quantidade enorme de frutos, difícil de calcular. O teor de vitamina C é o mais alto de todas as frutas conhecidas no novo continente. A sua polpa é utilizada para fazer suco.
    O tempo de duração do fruto após retirado da planta e bastante similar com o do açaí, tendo também possibilidades de ser melhor conservado no gelo.
    Este ano veio um barco de porte médio, de Barcelos, colher caçari .

    TAPEREBÁ

    Esta arvore produz um fruto bom para suco de perfume bem especial, bastante apreciado por locais e estrangeiros. O seu local de frutificação ocorre no Paraná da Floresta (mês de fevereiro) e no baixo Rio Branco (março).
    Não há exploração comercial.

    CIPÓ TITICA

    Material base para realizar tesumes para artesanato, vasouras, etc. A sua retirada da selva é demorada, um homem pode colher e limpar aproximadamente 50 kg. por semana, como quase único trabalho.
    Em Manaus o kg. do cipó é vendido ao publico, em fardos de 10 a 50 kg., ao preço de R$ 2 o kg.

    CANOAS

    Em São Pedro, Itaquera , Tanauáu e no Marrau de Bene existe fabricação de canoas.
    O trabalho é bem feito, o preço por eles praticado por uma canoa de 25 palmos (para 5 pessoas) é de aproximadamente R$ 70, o que , pela sua qualidade, representa menos da metade do preço que pode ser vendida em Manaus.
    O principal problema a solucionar é a falta de reflorestamento.

    MOVEIS

    Os fabricantes de canoas, bem orientados, podem realizar alguns tipos de moveis.
    Uma oficina na região de Itaquera pode trazer bons resultados, especialmente se há um estudo de mercado para decidir o estilo e o publico alvo.
    O reflorestamento é claro, uma prioridade.
    OBS. O ideal é trazer um engenheiro florestal por algumas semanas, para realizar um controle básico do estoque nativo e definir um plano de manejo.
    O CPPF do Inpa pode ser uma fonte importante de informaçães.

    O QUE PODEMOS FACER !!!!

    AÇAí

    Se tivéssemos um barco de 15/16 metros, com um 52 hp ou 114 hp, três freezer, um gerador a Diesel e uma maquina de moer açaí, podemos produzir o produto final, que seria colhido e processado em viagem, vendido para supermercados ou outro tipo de distribuidor (pode vir a existir futuramente até uma distribuidora própria de todos os produtos).
    Durante os dois meses de frutificação, a produção pode chegar até 20 ou 25.000 litros.
    Uma operação destas caraterísticas bem realizada pode pagar todos os gastos diretos e até o 70 % do investimentos em infra-estrutura (barco, maquinas, motores, etc.) que passaria a ser de primeira utilidade para o transporte mensal de todos os outros gêneros produzidos e para as futuras colheitas de açaí. Logicamente que a possibilidade de explorar, a partir desta experiência, o fruto do caçari, do taperebá, da bacava e do buriti, por exemplo, seriam totais, por ter o equipamento (so necessitaríamos comprar a maquina apropriada para cada fruto, já teríamos o barco, o gerador e as freezers)

    COMENTARIOS DOS COMUNITARIOS

    A possibilidade de que exista uma organização na melhora da produção (pesquisa, estoque, manejo), na compra dos produtos, com regularidade, no preço mais justo, no retorno do barco com as mercadorias necessárias, a preços de atacado (havendo compra para todos, é relativamente fácil conseguir as coisas a preços de 50 a 70 % mais baratos que os praticados pelos regatães), e ainda uma possibilidade de que a cooperativa traga melhoras sociais, não encontra obstáculos. O único sentimento que aparece é a desconfiança produzida pela experiência.
    Os regatães teriam finalizado a sua actuação na área, claramente, e não poderia vir a desaparecer essa cooperativa, ou então eles voltariam alem do 0, porque o regatão é ainda a única possibilidade de sobrevivência, dada a falta de união entre as comunidades e a falta de transporte.
    Eu acho que tem que trabalhar pôr consenso e não pôr maioria, para criar condiçães de auto-suficiência verdadeiras.
    A compra das terras e a preservação serão uma consequência lógica do trabalho geral.
    Os indios Waimiri-Atroari podem também estender a sua área de actuação e ter uma nova fase de relacionamento com os comunitários.

    PESQUISA FASE II

    Estes dados apresentados podem ser úteis para elaborar uma estratégia básica de acção. Nestes próximos dias, terei algumas reuniães que podem vir a esclarecer as características do mercado de Manaus, no que se refere a preços e capacidade de escoamento de produtos. Também será feito um levantamento mais aperfeiçoado sobre barcos, maquinas e transporte em geral. Também falarei com alguns técnicos e pesquisadores, para melhor conhecer as necessidades de tempo e recursos para a realização de um avaliação de estoque natural e de plano de manejo, que é de fundamental importância para o andamento do projeto , a sua credibilidade e aceitação.

    Daniel Garibotti

    Associação Amazônia
    6 de março de 1999